Hoje, decidi falar sobre nós, leitores. E de cara tenho uma dica de leitura!
Acabei de ler um livro com crônicas sobre os livros, leitores e autores, que me inspiraram a pensar nos meandros que compõem o universo literário aqui no Brasil. Ah! Primeiro, quero dar os parabéns pelos 10 anos de Página Cinco do
. É um feito e tanto ter uma coluna ou blog que fale sobre livros e literatura e perdure por tanto tempo. A revista onde escrevia sobre quadrinhos durou um pouco mais do que isso e também foi um feito!Bom, concluída a leitura de A biblioteca no fim do túnel: Um leitor em seu tempo, pensei nas diferentes crônicas que compõem o livro e que me fizeram refletir sobre tudo o que circunda os livros, mas principalmente seus leitores.
Há todo um ecossistema que compõe esse estranho e proporcionalmente pequeno mundo dos leitores e amantes de livros. Curioso que, apesar de não fazer parte da grande maioria dos brasileiros, o livro desperta polêmicas (algumas inesgotáveis!), que não cabem aqui ou em livro sobre.
Apesar disso, é bom acompanhar e refletir sobre algumas delas, até porque hoje estou na linha de frente do consumo — ou uso — dos livros: na biblioteca escolar.
Meu dia e meu universo gravita ao redor de livros e nunca me senti tão feliz com isso!
Acho interessante destacar, antes de mais nada, que a literatura, aqui no Brasil, raramente encontra um cenário favorável. A sensação é que estamos (leitores, editores, autores etc.) lutando contra uma maré de desinteresse progressivo nos livros. E, por vezes, estamos enfrentando descaso de políticos que são, entre outras coisas, inimigos da leitura, da cultura e das artes. Spoiler: quando artistas, professores e cientistas se tornam inimigos de um país, sabemos que a democracia corre um sério risco de acabar.
Um ser raro e difícil de descrever em palavras
Entre muitas de suas crônicas, o livro de Casarin questiona quem ou o que seria um leitor. É uma dúvida bem interessante.
Costumo dizer em casa que há poucos leitores no Brasil.
Será que estou enganado? Tirei essa ideia da própria orelha, embora a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil endosse essa percepção.
Minha hipótese é que leitores são como gateiros (amantes de gatos): pouca gente tem muitos gatos, muita gente não tem nenhum, nem vai ter. Mas tudo bem, quem ama gatos, assim como gosta de fazer tatuagens, nunca para em um só. Isso também vale para quem ama livros e quadrinhos. É colecionismo que se chama? Obsessão? Não sei. Seja educado(a) e me explique.
Difícil decifrar um leitor. Leitores, então, seriam aqueles que amam livros e/ou quadrinhos, de qualquer tipo e em qualquer suporte.
No entanto, quem ama ler acaba lendo muito, enquanto quem não vê graça na leitura mal consegue terminar e entender um simples manual qualquer. Do ponto de vista do prazer, um leitor quer mais do que ler algo; ele vai mergulhar em universos, desafiar ideias e, com sorte, expandir horizontes.
Além disso, não é porque alguém é leitor que podemos considerá-lo automaticamente esclarecido ou propenso a ações e pensamentos humanistas. Ao contrário, muita gente letrada demonstra poucos traços de humanismo, boa vontade ou empatia.
Alguns leem por prazer, outros por necessidade. No fundo, a grande maioria dos leitores carrega consigo a mesma inquietação: a busca por algo diferente, algo que mexa com seu espírito.
E, falando em espírito, é assustador pensar, como lembra uma das crônicas do Casarin, que, no Brasil, os livros religiosos encabecem as listas de mais lidos. Pois é. Em compensação isso nos dá um panorama do porquê estamos vivendo tempos tão sombrios. Será que estou exagerando?
Se o pensamento humanista, científico e voltado às necessidades gerais da sociedade for substituído por uma fé cega e muitas vezes inconsequente, que serve apenas para enriquecer alguns poucos "escolhidos", qual é o peso real das escrituras? Vale a pena se dedicar exclusivamente à leitura de textos religiosos só porque algum líder religioso mandou?
Nada na leitura é hermético. Muita gente terá conforto e entretenimento nos livros religiosos. A culpa é dos livros? Fica a reflexão e a dúvida.
Há quem “busque conhecimento”, enquanto outros apenas desejam se perder em boas histórias. Não é nenhum problema ler para se divertir ou para ter algum prazer e conforto.
Pensando um pouco mais a respeito do que é ser leitor, fica uma questão para mim. Todo leitor real, aquele que precisa das histórias para se entender e/ou relaxar da sua própria existência, que precisa compor sua história através da leitura de tantas outras.. carrega consigo a mesma inquietação: uma busca por algo mais através dos livros.
E você, o que acha que te define como um leitor?
Dicas, truques e quebra-galhos do Társis
Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra de Mia Couto
Sou suspeito para falar do autor de tantas histórias incríveis. Talvez o Mia Couto seja meu autor africano favorito, embora eu tenha lido muito poucos.
De qualquer modo, neste livro, a morte é o motivo que reúne toda a família e leva Marianinho de volta à sua terra natal, Luar-do-Chão, para comandar as cerimônias fúnebres do avô, Mariano — de quem herdou o nome e de quem era o neto favorito. A o retornar, Marianinho se descobre um estranho tanto entre os familiares quanto entre os de sua raça, pois, na cidade, ele adquiriu hábitos de branco.
É difícil falar mais sobre as estranhezas às quais o lugar e o personagem são submetidos. A história e a escrita são maravilhosas, mais um livro cativante do autor. Onde comprar: lojas virtuais e como sempre, pesquise antes naquela biblioteca pública perto da tua casa e pague zero reais.
O Morro dos Ventos Uivantes em Quadrinhos
Não é a versão na íntegra, mas ficou bem decente.
Tem um arte muito bacana do Wanderson Souza e vários conhecidos e colegas que manjam de quadrinhos estão envolvidos nessa produção caprichada da editora Principis, selo da editora Ciranda Cultural.
A Principis tem um trabalho interessante: produzir livros de qualidade, com edições modestas e preços muito acessíveis, principalmente para vender em bancas de jornal. Tu ainda se lembra das bancas de jornal? (Isso dá um ótimo post só sobre o tema).
Enfim, esse tipo de edição, com preço convidativo, é um contraponto aos livros de capa dura e edições luxuosas que dominam o mercado, por razões que não vou detalhar aqui. Ainda que seja uma edição mais simples, é flagrante o capricho na arte e na edição, desde a capa até a forma como capturaram o essencial da história. Gostei muito das soluções narrativas e da representação visual das personagens.
Em O Morro dos Ventos Uivantes, o jovem cigano Heathcliff perambulava por Liverpool quando foi adotado pela família Earnshaw. Enquanto criava laços afetivos com a geniosa Catherine, era malvisto pelo outro filho do casal, Hindley, que, no futuro, humilharia o irmão adotivo. Sofrimento, drama, brutalidade e rancor — tudo isso compõe uma história que nos deixa atordoados, com Heathcliff e sua obsessão por vingança.
Enfim, uma ótima edição, que se basta por si só, mas que também serve como porta de entrada para outras leituras, incluindo a obra original.
O valor da HQ está na casa dos 11 pilas, gente. Não tem como não comprar. Nem vou indicar bibliotecas!
O capítulo secreto - vol. 6 de A Biblioteca Invisível de Genevieve Cogman
Já disse outras vezes neste pequeno espaço que A Biblioteca Invisível é minha série juvenil favorita. Por favor, não chamem uma série Young Adult de Fantasia Urbana! Não me importa se está certo ou errado. O que vale é como eu chamo (viu,
?) XDO Capítulo Secreto foi o último livro da série traduzido no Brasil. Em inglês, há mais dois livros que ainda não foram traduzidos: The Dark Archive, o sétimo volume, e The Untold Story, o oitavo. Como geralmente há um intervalo de um ano entre o lançamento original e a versão traduzida, isso se encaixa perfeitamente na minha ideia de reservar todo o fim de ano para comer panetone e ler mais uma aventura de Irene, Kai, Detetive Vale, Silver e cia.
Como já disse aqui em outras ocasiões, essa é minha série favorita. Alguns livros são muito bons, outros acho apenas “legais” (não chegam a ser ruins), mas a questão é que é reconfortante ler um livro desta série todo final de ano. No ano passado, por conta do meu AVC, acabei não lendo e adiei a leitura para janeiro deste ano — uma leitura que fiz com muito prazer e que curti bastante — ainda mais por estar vivo.
Bom, nesta aventura temos a continuação dos livros anteriores, porém em um ambiente até agora não explorado. A bibliotecária Irene Winters e o príncipe Kai precisam se juntar a uma equipe improvável para realizar um extraordinário roubo de arte ou encarar a fúria de um excêntrico e dissimulado colecionador, que reside em uma misteriosa ilha escondida, repleta de armadilhas mortais. Me diverti horrores com essa homenagem ao 007 e recomendo este livro — e toda a série para vocês.
Encontre na biblioteca próxima da sua casa ou tire o escorpião do bolso e compre tudo. Estão entre 20 e 22 pilas em Sebos pela internet e 60 e 70 pilas quando novos — um precinho salgado, mas a média dos livros atuais.
Não sei se gosto tanto assim dá série porque se trata de uma bibliotecária em um universo fantástico ou porque, simplesmente, é bom, divertido e bem escrito. Leia e tire suas conclusões!
Era isso. Fico por aqui, na torcida para que você tenha saúde, dinheiro no bolso e uma leitura excelente e uma vida leve. Ou talvez o contrário.
Obrigado pelos parabéns e pela generosidade da leitura, Társis. Sempre uma alegria encontrar outros bons leitores pela vida :)